quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Monólogo de Dois

Pára com essa neurose toda, menina! Você é uma mulher madura, experiente com a vida e que conhece o lugar onde pisa, certo? Ai, mas que idiota que eu sou: tentando me convencer de coisas que nem eu mesma sei se quero acreditar. O que me importa, agora, é que eu tenho de parar com essa mania irritante de ficar reparando em tudo que ele faz, diz ou parece querer dizer. Ele ter mexido o dedo não quer dizer que ele queria se casar. Ele ter sorrido um sorriso diferente não quer dizer que ele mais feliz comigo do que com outra. Todas essas teorias, que essas mulheres babacas, como eu, passam horas usando, não servem para absolutamente nada, a não ser para nos deixar mais inseguras e incertas ainda.

Genial conclusão! Parabéns! Agora só falta você se levantar dessa poltrona – que já deve estar cansada de ouvir as suas reclamações – e fingir que nunca inventaram telefone, e que não há nenhum meio de comunicação que vocês possam usar pra dizer um ‘oi’. Vamos? Então tá. Ih, mas e se ele resolver ligar agora? E se, nesse exato minuto em que eu encostar a primeira célula do meu primeiro dedo do pé nesse chão gelado, ele começar a digitar o número da minha casa? Ora, se isso acontecer, eu dou um tempo – fazer um charme nunca é demais – e atendo, fazendo uma voz blasé de quem estava lendo um livro do Nietzsche. Mas você não acabou de se comprometer a esquecer essas teorias idiotas, que aquelas revistas, ainda mais idiotas, enfiam na nossa cabeça? Age de acordo com o que você pensa, ora! É a vantagem de ser humana, não? Ou seria a desvantagem?

Tá bom. Vou até a cozinha, pegar um iogurte zero calorias que não mata a fome nem de uma anoréxica de dieta, vou fingir que estou me deliciando com seu sabor e cremosidade, e vou me convencer de que, naquele pote, tinha vindo um Big Mac. Mas vou andando bem devagar, para que correr? [...] Droga, não consegui controlar minhas pernas, corri igual a uma maratonista, dei uma topada na geladeira, quebrei a gaveta de talheres, e ainda derrubei o pote daquele iogurte horroroso no chão! E pra que mesmo? Pra esse telefone maldito não tocar! Plena sexta-feira à noite, eu em casa, sendo obrigada a assistir a essa múmia almada, chamada Sérgio Chapelin, apresentando um programa chatíssimo que fala sobre os bichos do pantanal mato-grossense? Aqui, ô meu senhor, não existe nenhum veado aí, não? Ah, porque aqui, nessa cidade, tem pra dar e vender!

[...]

Sentada, na mesma poltrona, mas agora com o dedinho roxo do encontro com a geladeira. Bom... Excelente! Que mulher madura e experiente era você, mesmo? Vai fazer alguma coisa que preste, menina! Sei lá, vai ler aquele Nietzsche complexado e na encolha, vai! É mais útil do que ficar aqui, sem faze... (Trim! Trim!) Alô? (voz rouca, tossi logo depois, por causa de uma parte mais dura do iogurte que fica presa na minha garganta).

[...]

Ótimo, mas por que raios eu iria querer mais um cartão de crédito? Me diz, por favor! Tem como comprar vergonha na cara pra homens? Se der, me vê logo umas trezentas, um pra cada futuro relacionamento superficial e efêmero que eu vá ter!

Cansei dessa brincadeira. Perdeu toda a graça! Nem raciocinando mais eu estou direito. Vou praquela cama, sozinha, rodeada por meus travesseiros pra coluna que destroem meu pescoço, e por aquele edredom que esquenta no calor, e esfria no frio. Ah, que bom deitar. Por que eu não vim antes, não é mesmo? Poderia ter dormido muito mais!

Vamos dormir, né? Huuuum...

Mas e se ele me liga logo agora?

Um comentário:

Anônimo disse...

Já pensou se ele liga logo agora...