quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Monólogo de Dois - Parte X

Não tem jeito. Não tem pra onde fugir, querida. É na televisão, no comercial de todas as lojas ou qualquer outra representação comercial, desde a Líder Magazine, tão irritante quanto as roupas que ela vende, até, sei lá, a Casa de Biscoito. Não só na televisão, mas também pelas ruas, no plural mais coletivo de todos no mundo: padarias, supermercados, lojas de brinquedos, lojas de jóias, restaurantes, lojas masculinas, femininas, pet-shops. Tudo e todos se vestem de vermelho, e eis que surge um velho que não vê uma espuma de barbear há 2008 anos, com uma casaca também vermelha gigantesca, estilo Elisabeth XI e um gorro horrendo. Além disso, ele tem, sim, uma risada que, quando criança, me dava medo e, agora, quando adulta – às vezes só no corpo e nas estrias -, me deixa irritada. Demais. É isso, minha gente! O Natal chegou. E aquele grito de escola de samba não foi animado.

Natal é uma coisa engraçada, assim como qualquer outro evento mundial, ou só brasileiro. Assim, pra começar a história, vamos combinar que comemorar uma mesma festa há dois mil e oito anos, eu disse dois mil e oito, não dá, cara. Tudo bem que ela tem um significado bacana e tudo mais, mas, mesmo assim, é tempo demais pra um mesmo motivo. E o pior nem é isso: é aquela eterna hipocrisia. Ah, a hipocrisia natalina!

É evidente que, levando em consideração a época de ano, a Hipocrisia Hipócrita da Silva vem toda, toda: vestida de vermelho, cheia de presentes tão hipócritas quanto ela e com aquele simpático gorro comprado numa promoção na Uruguaiana, ou, no máximo, em um camelô de Botafogo. É realmente irritante: as pessoas, seja no trabalho, na família, ou onde for, falam mal umas das outras o ano todo, reclamam do comportamento alheio, tacam pedras em todo mundo e, quando vem o Natal, toda essa raiva é posta de lado. Por quê, exatamente? Por causa de um dos presentes mais irritantes da Dona Hipocrisia: o amigo-oculto! Sim, é aquela invenção desnecessária em que, para ninguém ficar com as mãos vazias, as pessoas trocam presentes obrigatoriamente entre si, e aí é que está o problema. O que você, cara amigo-ocultista, faz quando tira uma pessoa COMPLETAMENTE aleatória? Senta na boneca, amiga. Ou melhor, no presente mesmo, e chora, meu bem! Tem que se virar em mil para descobrir do que aquela respectiva pessoa quer ganhar, e a situação piora: o que você, Priscilinha, meu chuchu, vai dizer no seu discurso? Que aquela pessoa é muito legal? Você não a conhece. Que ela tem um ótimo caráter? Você nunca o testou, porque você não a conhece. Que ela é muito simpática e extrovertida? Não, você nunca saiu com ela, sequer trocou meia dúzia de palavras com ela, porque você não a conhece. Que ela trepa muito bem? Não, você nunca trepou com ela, porque vocês não se conhecem, porra! Ah, calma, calma, querida. Não precisa se estressar mais, não: a própria compra de presentes já é estressante o suficiente.

Sim, porque você fala, todo final de ano, depois daquele respectivo Natal, que, no ano que vem, você não vai dar presente pra mais ninguém, que chega dessa palhaçada. E o que acontece? Não consegue. Chega Dezembro do próximo ano, e lá vou eu, fazer todas aquelas compras de novo, pra chegar na casa de mamãe com mais sacolas do que linhas de expressão na cara e ter que distribuir aquela presentada pra aqueles primos pentelhos que pisam no seu pé de propósito e estão sempre com a porra da boca suja. De chocolate. Além disso, você ainda tem que ouvir aquela desculpa tão velha quanto o aniversariante desse evento: “Olha, Pri, foi só uma lembrancinha, tá bom? Só pra não passar em branco!”. Olha você, Tia Fulana: vai à merda! Eu prefiro, sinceramente, passar meu Natal em branco, sem seu presente, do que ganhar um pano de prato, porra! Aí meu Natal fica é roxo. De raiva!

Como se já não bastasse, a gente ainda tem que dividir em mil, além da compra de presentes, pra passar o Natal na casa de mil – sim, mais mil – partes da família, né? Tem, sempre, que dar um pulinho na casa da vovó, em Campo Grande, na casa do papai, em Niterói, e na casa da Titia, na puta que pariu. Olha só, minha gente: eu já gastei todo o meu 13º com os presentes! Não tenho esse dinheiro todo pra gasolina, não! E o mesmo acontece com a minha paciência, que acaba muito mais rápido do que o meu 13º.

Mas, depois de tantos vermelhos, tanto nas roupas das pessoas, quanto na minha conta bancária, vem o ano novo! Que beleza! Aí, sim, a coisa fica mais divertida, né? Pelo menos é uma festa mais com cara de festa e tudo mais... Uma festa, afinal de contas! Eu gosto mais, sim, do réveillon, mesmo que, todo ano, seja a mesma queima de fogos, na mesma praia.

Só sei que, afinal de tudo isso, o que sobra? Banha e mais banha. Mais banha ainda! Porque, depois de passar o natal em tantas casas diferentes, e comer tantas ceias diferentes, e de comer todo o resto delas, por dias e mais dias, a gente tem que, afinal, enfiar a cara no iogurte, nosso velho companheiro.

Aliás, acho que vou mandar um bilhetinho anônimo pras minhas tias, pra elas me darem um estoque enorme de iogurte, em vez de um pano de prato.

Have yourself a Merry Fucking Xmas! Apesar de tudo.

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