domingo, 13 de dezembro de 2009

Monólogo de Dois - Parte XXXII

É uma coisa muito irritantemente engraçada mesmo. A gente, quando tá sozinha, no prático estado civil ou no coração, vai ao cinema, assistir a um filme super mela-cueca, mela-calças, calcinhas, casacos e acessórios, chegando ao ponto de gargalhar em algumas cenas. Você e outras amigas (não nos diria, jamais, amargas, mas realistas, por assim tomar) metem o pau naqueles encontros impossíveis no metrô, nas juras de amor trocadas e, em algumas vezes, destroem, sem piedade, uma trilha sonora um pouco mais fofa. O fofa, aliás, super irrita a quem não está... Numa fase nada fofa. Eis que tudo aquilo que era motivo de piadas, de um humor negrérrimo por evidência, salta das telas, estapeia a sua cara desconfiada e, pronto: você é, então, o seu próprio ex-motivo de piadas.

É uma situação tão inesperada quanto o rolo de um filme se partir no meio, ou receber uma pipoca na cabeça, vinda de um favelado atrás de você (só pra constar, Priscila, se nos cinemas aos quais você tem ido isso acontece, meu bem, vamos trocar de shopping). Mais do que de repente, você faz uso daquele ótimo e muito útil zoom pessoal (quando consegue sair do seu próprio corpo e observar-se friamente) e repara que, pra você ser a própria história de “Um Amor pra Recordar”, só falta morar num buraco em Ohio, ainda acreditar na utilidade de tatuagem de hena e ser muito cafona nas roupas. Porque, de resto, você tá se enquadrando em todos os pré-requisitos do teste. Fazer aquela voz fofa-retardada-infantil vira outra simpática-uma-coisinha-só-de-vocês-dois. Em plena sexta-feira, o programa-de-velha-encalhada-ou-da-sua-mãe, quando vão só ao um restaurante, comer uma coisinha (outro fator de EXTREMA irritação, diminutivos; mas esses continuam irritantes) passa a ser o momento-de-privacidade-mais-legal-do-que-qualquer-noitada. Você se empolga e, às vezes, nem nota que, querida: você é a própria Sabrina, a Holy em pessoa, e, em alguns casos mais críticos (curáveis, no entanto), a Maria do Bairro brasileira.

Vê, então, que os antigos motivos de piada são, agora, motivos de taquicardia emocional. Vê que o humor mais seco se embebe todo de uma melado rosa pink; uma magenta, pras mais refinadas, também serve. Vê que você... É quase outra pessoa, se for comparar os seus gostos de hoje com os de ontem. Melhor: as suas prioridades de apaixonada (loucamente, mas achada, não perdida) e as de não-apaixonada (perdida, mas não loucamente). Hum, que coisa estranha. Outra pessoa? Se minha terapeuta (sim, Priscila, hoje, com a crise econômica mundial, é super normal usar a sua melhor amiga como psicanalista) me ouvisse chamar a mim de outra pessoa, iria me matar. Que é isso, afinal?

Simples, mas complexo: é você, ainda, só que com outro alguém que, nessa cena da vida real, completa a parte que faltava. Sem aquela baboseira de alma gêmea (como se ainda fosse útil salvar-se da cafonice melada nesses pensamentos todos), é um outro que combina com você e mostra que o fofo-irritante, até então, pode ser muito bem-vindo.

Mostra que ficar o sábado inteiro de sol, em casa, fazendo comida, vendo televisão, falando besteira, dentro de um pijama antissocial, vendo coisas inúteis na internet, rindo e sorrindo sem dar dor no maxilar pode, sim, ser não só possível, mas muito bom também.

Mesmo com isso tudo, a gente ainda mantém o mínimo de originalidade, claro, o básico pra poder dizer ao Orkut quem você é (pergunta mais existencial na atualidade, convenhamos). Guardadas as devidas exceções entre o cinema e a vida que ele retrata (fielmente ou não), você pode dizer, sim, que ta exatamente no meio do caminho nessa importação e exportação entre a sétima arte e primeira de todas: viver.

E essas novidades todas devem vir do que a gente tanto procurava, munidas do nosso humor negro e das nossas super noitadas. Vai ver que a gente acabou de achar não precisamente aquilo que tanto queria encontrar; mas uma outra coisa que a gente nunca pensou em achar, mas que nos surpreendeu. Sendo brega ou não, a melhor postura, nesses casos, só pode ser uma: aproveitar que você foi aprovada no teste do seu próprio filme, agarrar a chance, fazendo as nossas cenas, os nossos remakes, as nossas edições. Acreditando que, apesar de não parecer, é possível ter o nosso próprio filme melecado e romântico. O que vai acontecer ao longo dele, só o diretor sabe (que, nesse caso, não existe). De qualquer maneira, eu é que não vou desperdiçar o meu ingresso.

Afinal, por que eu não posso ser uma Iris de mim mesma?

Um comentário:

Paulina Bracho disse...

Olha, o diretor pode até não saber, mas o roteirista já me contou o final do filme... hahahaha