segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Monólogo de Dois - Parte IV

Sim, eu fui! Ele foi! Nós fomos! Meu Deus, nem acredito que, depois de tanta agonia, a gente realmente saiu decentemente, sem chefes ao redor, e sem escritório sob nossos pés e cabeças. E o mais curioso e engraçado é que, para variar, tudo aquilo que eu havia planejado deu errado, né? Típico, Priscila. Típico. Isso acontece desde que você queria ser a princesa seqüestrada, na pecinha da escola, e acabou sendo umas das maçãs que caíam das árvores. E caíam uma vezinha só. Já deveria ter se acostumado, mas nada.

Eu poderia ficar me lembrando de cada minuto pra sempre, como se ele tivesse acabado de passar. Para começar o desastre que deu certo, eu rodei, andei, subi escadas e desci elevadores de todos os shoppings aos que eu tive paciência de ir. Para quê? Nada. Não achei uma peça de roupa decente, que me agradasse e que tivesse um preço razoável. Até porque eu me recuso, terminantemente, a pagar 200 reais em um vestido. Fiquei pensando, então, em alguma roupa que eu tivesse naquele esvaziado armário, e nada. Consegui até me lembrar de algumas, mas, para variar, elas estavam pra lavar, mesmo não estando sujas. Eu tô precisando dar umas dicas pra essas empregada, hein?

Íamos sair num dia. A família dele resolveu convocá-lo no mesmo dia. Sim, na mesma hora, né? Até porque, se fosse em horário diferente, não seria a minha vida, óbvio. Nada é fácil pra você, Priscila. Nada! Conclusão: quando ele conseguiu ser libertado das garras genéticas, eu já não poderia mais sair. Não, não era desculpa, óbvio, mais uma vez. Eu, aquela louca psicótica, morrendo de ansiedade e medo, nunca iria desmarcar, mesmo a roupa não dando certo, e mesmo eu tendo acordado com um Arquipélago das Bermudas, em forma de espinhas na testa. Desmarcamos, então, mas acabamos saindo. Pelo telefone. Sim! Ficamos horas ao telefone! Pra desligar, ah, foi um parto. Mas a criança acabou nascendo, e a gente, desligando o telefone, depois de muitos joguinhos de palavras, que eu nunca consigo fazer direito: sempre se entrega, né, babaca?

Qual não foi a minha surpresa quando ele me liga, no dia seguinte, remarcando a nossa saída? Nossa, foi uma loucura! Saí correndo que nem uma doida pela casa, direto pro meu quarto, pra esvaziar aquele guarda-roupa todo de novo, pra ver, de novo, que nada prestava. Fiquei desesperada, gritando sem parar, até que eu achei, perdido, no fundo no armário – quando eu estava socando as portas de raiva -, um vestido lindo! Era, na verdade, da minha mãe, e ela resolveu restaurar e me dar. Isso é uma coisa engraçada, né? Se alguém mais novo coloca uma vestido, um óculos ou calça velha, vira vintage e retrô. Agora, se uma velha coloca essas coisas velhas, ela é só uma velha sem noção. Fingi, então, ter total desprendimento sob as minhas roupas, como se aquela peça tivesse surgido sem querer e sem esforço, tipo – Opa! Achei. -.

E eu fui. Ele foi. Nós fomos! O problema é que, como se trata da minha vida amaldiçoada, eu cheguei super atrasada, e não porque quis fazer um charme – o que acabou acontecendo, eu acho -, mas porque me enrolei toda naquele trânsito maldito, nessas ruas do Rio, que são muito confusas. Também, por que eu fui inventar um lugar tão complicado, só pra parecer cult e casual, né? Acho que só a roupa da mamãe já seria o suficiente pra mostrar como eu era desencanada. Ou cafona e velha.

Conversamos, rimos. Bebemos, comemos. Mesmo aquele maldito lugar estando lo-ta-do, - o que não fazia o menos cabimento, levando em consideração o dia e a hora -, teve alguns momentos em que eu consegui me sentir sozinha. Só com ele à minha frente. E isso acontecia a toda hora que ele me sorria um sorriso cheio de significados – tá, nesse caso, tinha significado, sim, ok?

De repente, do nada, ele me surpreende. Foi inesperado. Foi invovador. Foi impulsivo. Foi inédito. Foi bom. Demais! Nem quero me lembrar, pra não começar a rir, sozinha. Só sei que saí de lá flutuando como uma pluma, mesmo estando tão gorda quanto trezentos quilos de plumas. E a gente já tem até uma música nossa. Tá, tudo bem, ele ainda não sabe disso. Mas foi uma música que tocou na minha cabeça logo depois que eu o vi indo embora, andando calmamente – ou nem tão calmo assim -, e eu sorri, sem querer, sem prever. Involuntariamente.

Ih. Música pros dois, sem ele saber?
Flutuando igual a uma pluma?
Sorriso involuntário?
Merda.
Merda! Será que isso em que eu tô pensando?

Mas cadê aquela bendita revista de auto-ajuda agora, Senhor? Não. Não é essa, nem essa. Nem essa. É, amiga: acho que você já tá na merda. Naquela merda que cheira a perfume francês. Masculino, nesse caso. Bem-vinda!

Burra.

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